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Dois meses

por Ligia Pinheiro Barbosa

08 de junho de 2020

Dois meses

Dois meses: pouco ou muito tempo? A medida de tempo curto ou sobrando depende do nosso estado de espírito, do tipo de trabalho, do gosto pelo que se faz, de muitas coisas. Pois é, lá se foram sessenta dias, dois meses, de isolamento social, quarentena, ou o nome que quiserem dar a esses dias nos quais, eu acho, têm sido suficientes para trabalhar o trabalho normal ,o da lida caseira (lavar, cozinhar, limpar) e ainda pensar. Pensar sobre como é bom ter alguém fazendo o serviço “autolimpante” da casa e liberar nosso tempo para ler, escrever; como é bom ter uma casa e comida, como é bom ter amigos para conversar, música para ouvir, “lives” para assistir. Eu acho que esse tempo mostrou, pelo menos aos privilegiados que têm o que foi dito anteriormente, o quanto temos de supérfluo em nossas vidas. Os armários estão cheios, mas você precisa de duas ou três mudas de roupa; ir ao cinema é maravilhoso, mas filmes em casa são bons substitutos; as pessoas passaram a dedicar um tempo para fazer a própria comida e nisso descobriram um prazer; aprenderam a dividir os espaços, e apesar da dificuldade, estão encontrando um meio de viver em harmonia. Quando não se tem opção, é preciso fazer uso inteligente do que há disponível.

Em muitos outros lugares os 30 dias não são tão bons: casas minúsculas abrigam muitas pessoas, a comida é pouca, o cobertor é curto, a vida é mais dura. Sempre achei que nesse mundo onde a realidade é mais dura, as pessoas têm mais presente o “agora”, pois veem no dia a dia a finitude da nossa existência. Como sempre, muito menos a dizer, muito menos a perder – materialmente falando, porque na atual circunstância, o que vale mesmo é ficar vivo. Então, o que vale é o agora.

Sempre foi. Vi uma entrevista com o filósofo Mario Sérgio Cortella na qual ele dizia que o tempo mais difícil de se viver é o presente. Não deveria, por ser o único que existe. Mas estamos sempre remoendo alguma coisa passada ou preocupados com o que vem, com o futuro. Mas feliz ou infelizmente, não há o que fazer para mudar o que se viveu ou ter certeza do que está por vir. Portanto, a lição que nos dá o isolamento forçado é: viver o agora.

As pessoas discutem se o mundo vai mudar, se todos vão ser bonzinhos, vão pensar no próximo e por aí vão. Eu creio que teremos mudanças no comportamento e nas rotinas, por diversos motivos, mas a maioria delas será por um período, até que esqueçamos as mazelas agora vividas. Depois entraremos na nova rotina, pensando que somos imortais, desejando muitas coisas, nos atolando de supérfluos – que nem sempre são ruins, pelo contrário.

Enquanto o futuro não chega, vamos nos aprofundar a viver o presente, com o céu mais azul, as águas dos rios mais limpas, os pássaros em festa porque sendo ouvidos. E ao mesmo tempo, ajudar os que não estão podendo usufruir de tudo isso, porque são dos serviços essenciais e continuam a trabalhar, por nós. Gratidão é o que sinto por todos eles.

COLUNA DA LIGIA

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